Tradutor

sexta-feira, 16 de março de 2012

O melhor amigo também do homem do campo


Foto da internet 
Eles são considerados o melhor amigo do homem. Há milhões de anos convivem conosco e cada vez mais os laços de amizade se estreitam. Nem a ciência consegue explicar o porquê dessa relação de tanto carinho e cumplicidade. Quem tem um cachorro em casa sabe muito bem como é esse caso de amor.

Os cães, além de fiéis, companheiros e guardiões, também são considerados grandes parceiros do homem do campo. E essa relação já vem de muito tempo. O pastoreio com cães é utilizado desde que o homem começou a domesticar os animais, há cerca de 12 mil anos. A partir de então, o cão pastor vem sendo aperfeiçoado gradualmente. Segundo Liliane Morriello, juíza internacional de provas de pastoreio afiliada à ISDS (International Sheep Dog Society), a primeira evidência escrita do cão de trabalho foi descoberta em um documento chamado “Ye olde Sheppard’s dogge” datado do século 13 e descreve collies trabalhando. “Naquele tempo, eles não eram chamados de border collies, mas simplesmente “cães collies”.

Se acredita que a palavra “collie” deriva do gaélico “Coly” significando “preto”, ou exatamente a mesma palavra do gaélico “collie” significando “útil”, explica.

Descendentes dos lobos, os cães carregam no sangue a facilidade para o pastoreio em razão de um hábito instintivo dos seus antepassados, que arrebanham lotes de herbívoros e os conduzem a um ponto onde o lobo alfa, descansado, está a espera para abater a presa que servirá de alimento para toda a matilha.

O cão de pastoreio serve para auxiliar o homem em todo tipo de manejo com gado, aumentando a rapidez, a eficiência e a economia dos trabalhos. “Basicamente servem para recolher, controlar, conduzir e encerrar rebanhos. Ele pode trabalhar sob um “controle remoto” (submissão absoluta aos comandos do seu dono) ou no “piloto automático” (com autonomia e iniciativa próprias). O modo com que ele trabalha, recolhendo e trazendo o rebanho até o homem, deixa os animais mais calmos e inverte a situação do gado ter o homem como inimigo, que passará a ser protetor”, explica Fernando Loiola Alves, técnico agrícola e treinador do Centro de Treinamento Bela Vista, localizado na cidade de Araxá/MG.

Liliane vai mais além e explica que os objetivos em se trabalhar com cães de pastoreio são o aumento da eficiência e o corte de custos, enquanto se reduz o estresse do manejo do rebanho, que, por sua vez, também aumenta a produtividade e a qualidade do produto. “A principal vantagem é que ele nunca pede folga ou aumento de salário e sempre vai ao trabalho. Tudo o que ele pede é um lugar fresco e seco para dormir, alimentação adequada para manter sua saúde e lealdade”, diz a juíza.

Durante o trabalho, o cachorro se diverte porque recorda a aptidão ancestral de arrebanhar juntamente com o instinto de caça desviado pela seleção do homem. O gado, por sua vez, por compreender a linguagem do cão, se sente melhor e coopera mais, desloca-se menos e de modo mais calmo, sem necessidade de relhos, guizos, gritos e atropelos, o que reflete em menor estresse e menor desperdício de energia. Com isso, o pecuarista faz mais serviço em menor tempo e com menos esforços. “O homem sai beneficiado pela eficiência e economia, o gado se torna mais produtivo porque é tratado de modo mais natural e compreensivo, e o cão fica satisfeito por fazer o que gosta”, salienta Alexandre Zilken de Figueiredo, advogado e pecuarista, proprietário do Canil Torena, localizado no município de São Lourenço do Sul/RS.

A relação com o gado

Foto da internet 

Uma das raças mais utilizadas no País para o pastoreio é a border collie. Um bom border collie pode, em média, trabalhar com 200 a 300 ovelhas ou 80 a 120 cabeças de gado.

O trabalho também depende de que o rebanho esteja sendo trazido para o condutor ou sendo conduzido para longe de quem conduz. “Com o tempo isso se torna óbvio, pois o rebanho começará a reconhecer o condutor como um “porto seguro” tornando a trazida mais fácil que a condução dos animais para longe dele”, explica Liliane.

O border collie bem treinado responde com obediência absoluta aos comandos de seu dono. Segundo Fernando, comandos são sons que o treinador usa para se fazer entender pelo cão. “Esses sons devem ser claros, definidos, e pronunciados sempre da mesma maneira, embora seja possível flexionar a pronúncia para enfatizar o comando”, explica.

Em alguns casos, o apito é usado para substituir a voz humana, por ter mais definição, alcance e penetração na atmosfera. Os sons do apito chegam mais claros ao cão quando ele trabalha distante do condutor. Entre os comando de voz, os mais utilizados são os referidos no quadro abaixo:

Fernando explica que o treinamento se baseia em colocar apelidos aos movimentos dos cães, pois ele já tem instinto para a atividade. “Se você soltar um filhote de border collie de boa genética perto do rebanho, ele instintivamente vai pastorear. Só é preciso treiná-lo para fazer da maneira correta. O contato com o rebanho, na maioria dos cães, começa com um ano de idade, pois é a fase em que ele está formado fisicamente e preparado para sofrer pressões do treinador e do rebanho. Além disso, a um ano de idade o cachorro já está se tornando adulto e não estará mais brincando”.

Para se preparar um cachorro, deve-se iniciar trabalhando em uma área pequena até que o animal tenha um certo domínio sobre o rebanho, além de começar a ter noção para conduzir os animais até onde o pecuarista desejar. Quando o cão estiver dominando essas funções, pode-se trabalhar em uma área maior. “Caso algo não estiver dando certo, volte novamente para um lugar menor e ensine outra vez o cachorro. Se o animal voltar a errar, corrija-o no ato. Na maioria das vezes, a maior punição para os cães é não deixá-los trabalhar, que é o que eles mais gostam de fazer. Com isso, ele vai saber que quando está trazendo o rebanho para o pecuarista, ele está agindo da maneira correta e então continuará trabalhando”, ensina Fernando.

O cão se relaciona com os exemplares conforme eles se comportam. Tende a ser rigoroso com um rebanho rebelde e suave com um rebanho submisso. O cão, no início, se apresenta como um predador para se impor aos animais.

Conforme o rebanho sente que não consegue vencer o cão em velocidade, agilidade e força moral, o grupo acaba se submetendo ao cachorro. “O cão percebe isso e também relaxa sua atitude. O trabalho de um cachorro treinado gera muito menos estresse aos animais do que um homem gritando, atropelando o cavalo ou usando aguilhões e relhos”, diz Alexandre Figueiredo.

“O cão de trabalho não ajuda apenas a manejar o rebanho com menos estresse, mas também fará a tarefa na qual ele está envolvido de maneira mais eficiente, poupando tempo e horas trabalhadas dos funcionários. Recolher os animais do pasto e trazê-los para a sede em questão de minutos sem precisar selar um cavalo, conduzir gado, ovelhas e cabras na mangueira para que sejam pesados e tratados, contagem de animais e apartação de exemplares que necessitam de cuidados especiais se tornam serviços menos trabalhosos com o auxílio dos cachorros”, avalia Liliane.

Custos são relativos

Quando se fala em custos de cachorros, o assunto se torna muito relativo. Segundo Liliane, uma das desvantagens aqui no Brasil é que todo proprietário de border collie pensa em si como um “criador de border collies” e, com isso, uma quantidade enorme de animais não tão bons estão sendo colocados no mercado por até R$ 100. “Quem trabalha com animais de elite sabe que este valor não cobre nem as vacinas básicas”, alerta a juíza. De acordo com Liliane, um bom filhote pode chegar até a R$ 3,5 mil. “Um cão jovem iniciado, que já circula e atende a comandos básicos, pode custar entre R$ 2,5 mil até R$ 3,5 mil.

Um cão mais avançado vale cerca de R$ 5 mil e um cão completamente pronto para a lida atinge até o dobro deste valor”, diz a juíza. Na Europa, a raça atinge, quando treinados e experientes, valores entre R$ 25 mil e R$ 30 mil.

Para os pecuaristas que querem começar a investir no segmento, é importante assegurar que o filhote venha de linhagens boas de trabalho. Uma maneira de garantir essa qualidade é ver os pais trabalhando ou competindo. Ele deve procurar ajuda de um profissional sério, que dará o direcionamento desejado ao cão, e assim evitar quaisquer problemas.

Os cães, além de gado, ovelhas e cabras, podem pastorear gansos, marrecos, cavalos, galinhas e até veados. “O importante é saber avaliar o cão e a situação a qual você o está submetendo. Eu já trabalhei com alguns destes animais e é importante que o cão seja calmo e saiba “ler” o rebanho a ser trabalhado. Como regra geral eu digo: treine com ovelhas para depois trabalhar com gado”, alerta Liliane .

O custo maior está na aquisição de um filhote e no treinamento. Depois, os gastos se resumem a compra de ração, que representa aproximadamente R$ 50 por mês com cada cão, vermífugos – em torno de R$ 7 no mesmo período – e as vacinas básicas a qualquer cachorro.
Praticamente não existe desvantagem na utilização dos cães, afirma José Roberto Cintra de Arruda, proprietário do Little Ranch, empresa que ministra cursos de pastoreio em parceria com a USP. “O único problema que enfrentamos é que, aqui no Brasil, as pessoas ainda não acreditam na ferramenta de trabalho que são esses cães.

Na Europa e nos EUA, as pessoas que criam gado e principalmente ovelhas não sabem trabalhar sem ajuda deles. No caso dos border collies, por serem arrebanhadores, esbarramos na nossa cultura de manejar os rebanhos que é empurrando. Antes de se trabalhar com esses cães, precisamos ensinar as pessoas a deixar os animais irem buscar o rebanho para elas”, explica Arruda.

A experiência de quem usa

A fazenda Marambaia, com sede em Petrópolis/RJ, é um exemplo de propriedade que utiliza cães de pastoreio para cuidar do rebanho. Os cachorros são utilizados com o objetivo de proteger as ovelhas de predadores e furtos. Eles circulam por todos os piquetes tomando conta dos animais.

A fazenda utiliza os cães desde 2001, e, segundo a funcionária Mariana Miloski, em cinco anos diminuiu a zero o número de ataques dos predadores. A Marambaia começou com apenas um casal de cães, e, mediante os resultados obtidos, foram incorporando outros exemplares. Atualmente, a fazenda conta com 9 fêmeas e quatro machos para pastorear todo o rebanho de ovinos.

Mariana conta que os cuidados com esses cães são muito simples. “É como cuidar de um cão de estimação. E o mais importante é fazer com que tenham um bom relacionamento com o rebanho. Aqui na fazenda já aconteceu de cadelas amamentarem as ovelhas recém nascidas e ovelhas amamentarem os filhotes dos cachorros. Por serem criados desde pequenos com o rebanho, os cães “entendem” que aquela é a sua família e a protegem de todo e qualquer predador”, conta.
Número 1 em pastoreio

A raça border collie foi desenvolvida na Inglaterra, na divisa com a Escócia, há 300 anos, para trabalhar com ovelhas. Os americanos começaram a utilizar a raça para cuidar de bois e, com isso, os animais foram se espalhando pelo mundo. “Hoje, podemos ver esses cães trabalhando no mundo todo com cabras, ovelhas, bois e aves. Ou seja, o border collie pode trabalhar com qualquer animal que tem a tendência de se arrebanhar. Já vi pessoas trabalhando com cavalos e tocando porcos, porém, na minha opinião, não é natural para eles”, diz Arruda.

Por ser a raça mais completa e mais eficiente, será sempre possível encontrar cães com diversas características. “Tudo que as outras raças fazem, um border collie pode fazer. O diferencial é que nenhuma outra raça faz tudo que um border tem condições de fazer”, afirma Fernando, relatando que as principais características dos cachorros são: precisão, eficiência, inteligência, entusiasmo pelo trabalho, versatilidade, senso de rebanho (cowsense) e o silêncio.

Segundo pesquisas,o border é a raça mais inteligente entre todas as genealogias do mundo. Além disso, os animais são muito voluntariosos e sensíveis. “Se sofrerem qualquer tipo de maus tratos, dificilmente vão querer trabalhar para você”, afirma o proprietário do Little Ranch.

A raça, por sua extrema eficiência, fez uma revolução no trabalho com rebanhos nos últimos dois séculos. É o cão de gado e ovelhas mais utilizado no mundo. “É importante, porém, ressaltar que o uso do border collie não se baseia apenas nas qualidades do cão, mas nas técnicas de treinamento e condução. É um pacote tecnológico onde cada elemento tem igual importância”, finaliza Fernando.

Esse trabalho se baseia na compreensão e na comunicação entre homem – cão – rebanho. Maus tratos prejudicam tanto o adestramento quanto a condução do cão. Segundo todos os entrevistados, o cachorro deve sentir o homem como seu líder e companheiro de trabalho. O medo vai fazer ele perder a confiança no homem e não render no trabalho. Também o cão não tende a ser violento desnecessariamente com animais. As mordidas, em geral, não machucam e os ataques ocorrem apenas em situações extremas, como no caso de um animal ser violento com o cachorro.




Gabriel Bononi